As obras que estão patentes no palacete sede do Instituto Camões, em Lisboa, até 16 de Maio, numa exposição intitulada «9 Vozes, 9 Lugares - Finlândia» não pretendem fazer a história da arte contemporânea finlandesa, ou sequer, de forma unificada, defender uma qualquer tese.
Número 125 · 7 de Maio de 2008 · Suplemento do JL n.º 981, ano XXVIII
A intenção parece mais simples: trata-se de mostrar o trabalho de nove artistas plásticos finlandeses, cuja actividade, no dizer do curador do evento, o português Sílvio Salgado, é a mais «premente» na actualidade do panorama da arte contemporânea daquele país do Norte da Europa, um dos mais desenvolvidos e ricos da União Europeia.
A ideia foi «apresentar nove artistas plásticos, cada um dos quais tem o seu lugar distinto a partir do qual se lança nas suas explorações artísticas. Obviamente, cada um deles tem uma forte ligação à Finlândia: quer como lugar em que cresceram, quer como lugar em que estudaram ou trabalharam, é uma localização que influenciou fortemente o seu conjunto de experiências e o seu trabalho», escreveu na apresentação da exposição Sílvio Salgado, que, tendo nascido em Moçambique, na multicultural Zambézia, viveu três anos e meio na Finlândia, onde comissariou diversas exposições para os museus do país.
Só a geografia (a Finlândia) e a «relação com o país» são a referência comum da exposição, sublinha o curador.
De facto, dois dos nove artistas plásticos participantes não são finlandeses de origem, são imigrantes, embora a Finlândia, ao contrário de outros países nórdicos, não tenha uma grande comunidade de origem estrangeira.
Adel Abidin nasceu em Bagdad (Iraque) e vive e trabalha desde 2000 em Helsínquia; Panagiotis Balomenos nasceu na Grécia e desenvolve a sua actividade entre Helsínquia e Atenas. Abidin foi o primeiro artista plástico de origem estrangeira a representar a Finlândia no exterior, na 52ª Bienal de Veneza, em 2007, onde apresentou a sua agência de viagens fictícia, a Abidin Travels. «Revolucionário», sintetiza Salgado, lembrando que também em 2007 uma artista plástica de etnia cigana de origem finlandesa esteve em Veneza no Pavilhão Roma.
Por outro lado, dois outros artistas plásticos com trabalhos na exposição de Lisboa, Minna L. Heriksson (instalação mista de media - objectos, pintura, texto), e Petri Huurinainen (som, instalação mista), embora ligados à cena das artes plásticas finlandesas, trabalham no estrangeiro. A primeira em Istambul e o segundo em Londres.
Até agora, contudo, «muito pouco aconteceu», escreve Sílvio Salgado, que permitisse ao país que «exportou para o mundo a música de Sibellius, a arquitectura de [Alvar] Aalto e os telemóveis Nokia» tornar conhecidos no exterior a sua nova geração de artistas plásticos, para mais em Portugal, que se encontra no que se poderia designar como os «antípodas europeus» da Finlândia. «Não podemos estar mais distantes», declara o curador, sendo essa distância, traduzida em desconhecimento cultural, que a exposição em Lisboa pretende reduzir. «Não existe uma ponte cultural, de conhecimento comum entre os dois países», acrescenta.
O que não quer dizer que se trate de desconhecidos - «todos eles ofereceram já muito à cena das artes plásticas internacionais. Agora os portugueses têm a oportunidade de conhecer a sua arte».
Esta aparente distância é contrabalançada pelo facto de as preocupações gerais políticas, sociais e culturais dos artistas plásticos finlandeses serem comuns ao mundo e à União Europeia.
Os artistas presentes na exposição, fiéis à marca de água de muita da arte contemporânea, também não praticam qualquer espécie de confessionalismo quanto aos meios a que recorrem para expressar as suas ideias. Os meios utilizados por estes nove artistas plásticos torna-os em Lisboa bastante distintos uns dos outros: a pintura e a escultura, claro, mas também os sons, a fotografia e o vídeo são media escolhidos.
Mas, avisa Sílvio Salgado, «todos têm a capacidade de usar diferentes media. O mais confortável depende apenas da ideia que querem comunicar ao público». «Actualmente os artistas não se limitam a um media», sustenta o curador, referindo o caso de Roi Vaara, conhecido internacionalmente pelas suas actuações (performances) ao vivo, que na exposição de Lisboa utiliza o vídeo.
Roi Vaara é um dos artistas plásticos fortemente afirmativos, juntamente com Jukka Korkeila (pintura, intervenção localizada), que teve "um importante papel em abrir caminho para a nova geração».
O conjunto dos nove artistas plásticos, embora represente o que há de «mais destacado» na arte contemporânea actual, no dizer dos organizadores da exposição, é constituído tanto por quem está na corrente principal da cultura, como por marginais (outsiders), sendo estes entendidos como alguém que "permanece por um certo período de tempo dentro de uma cultura particular [...] e que durante esse tempo age para compreender e mudar aspectos desta cultura».
Assim, «as nove ‘vozes\' dos artistas encontram-se na exposição, criando algo mais do que a sua soma», considera Salgado. Os outros artistas plásticos presentes são: Päivi Häkkinen (instalação escultórica), Kati Immonen (pintura, artes gráficas, instalação) e Harri Palviranta (fotografia).
Dois textos, um de João Romão, que aborda o contexto da exposição numa perspectiva sociológica, e outro de Antti Kaski, politólogo, que a encara no âmbito sócio-político, acompanham o evento.
A mostra acolhida pelo Instituto Camões é organizada pelo Instituto Ibero-Americano da Finlândia em Madrid e pela Embaixada da Finlândia em Lisboa, sendo «generosamente apoiada» pelo Finnish Fund For Art Exchange (FRAME) e pela Vienna International Apartment Art Association.
Depois de Lisboa, a exposição rumará a Espanha, onde no final do ano estará patente no Museu das Cortes de Cádis.