Instituto Camões
Cursos a distância no processo de Bolonha
A formação académica está em mudança. Onde dantes havia rigidez e uma via única, há hoje flexibilidade e variadas vias. O processo de Bolonha veio acabar com o ‘pronto-a-vestir\' curricular e alarga as possibilidades da formação superior. O ensino a distância é uma das áreas que abre novas possibilidades nesse domínio e o Instituto Camões está atento a elas.Número 124 · 9 de Abril de 2008 · Suplemento do JL n.º 979, ano XXVIII
Três dos 14 cursos que a plataforma de aprendizagem em linha do Instituto Camões ministra no ano lectivo de 2007/2008 estão creditados no âmbito do processo de Bolonha e a intenção é alargar esta certificação europeia ao maior número possível. Os seis créditos pela conclusão de cada um dos três cursos são acumuláveis para efeitos de licenciatura e mestrado.
Os cursos presentemente creditados são Ensino/Aprendizagem do Português Europeu L2, Literatura Dramática Portuguesa Contemporânea e Tradução e Tecnologias de Informação Linguística, ministrados por docentes da Faculdade de Letras de Universidade de Lisboa (FLUL).
Desde 2005/2006, os cursos a distância do IC incluem uma valência intitulada Cultura Portuguesa Contemporânea: tempos, factos e autores, que pretende dar «uma visão multidisciplinar e transversal da conjuntura histórico-artística da sociedade portuguesa do pós-25 de Abril de 1974».
Os nove módulos do curso, concebido e organizado na sua 1ª edição por António Pinto Ribeiro, e agora com coordenação de Isabel Carlos, abordam os temas da arquitectura, património, fotografia, artes plásticas, cinema, teatro, dança, música, design e moda. A certificação deste curso no âmbito do European Credit Transfer and Accumulation System (ECTS) está a ser equacionado entre o Instituto Camões e a Universidade Aberta.
Outros cursos disponíveis compreendem Materiais Interactivos para Português Língua Estrangeira, Português para Estrangeiros (1 e 2), Laboratório de Escrita Criativa (dois cursos, sendo um avançado), A Novíssima Poesia Portuguesa e a Estética Contemporânea, Português para Jornalistas e Literaturas Africanas de Língua Portuguesa.
Em fase de elaboração está um Curso de Intercompreensão, ou seja, o ensino conjunto de línguas - Português, Francês e Espanhol -, concebido e coordenado pela professora Maria Antónia Mota, do Centro de Linguística da Universidade de Lisboa, que poderá vir a arrancar no próximo ano lectivo (Setembro/Outubro), em plataforma electrónica, numa parceria com o Instituto Camões (ver p.2).
Comunidade de Saber
Para os seus cursos em linha, o IC adoptou uma perspectiva pedagógica «construtivista», isto é, «os cursos dinamizam a construção de uma comunidade de saber à volta dos temas», comunidade essa constituída por professores (e tutores) e alunos e ligada por intermédio de uma plataforma electrónica.
Essa foi a abordagem escolhida, já que «a tecnologia não é neutra, permitindo diversas perspectivas pedagógicas», segundo afirma Rui Vaz, coordenador do núcleo de produção de materiais para o ensino a distância e responsável pelo Centro Virtual Camões, que serve de suporte tecnológico ao curso.
Por essa via são distribuídos materiais didácticos, criados especificamente para estes cursos (programas, bibliografias, textos de estudo e provas de avaliação) e é com recurso às páginas de internet, aos fóruns, aos chats, ao correio electrónico e a outras actividades interactivas que se estabelece o processo de aprendizagem. Os trabalhos realizados, entregues em linha, permitem a formalização da avaliação.
A origem dos alunos é diversificada, muito dependendo da temática escolhida. No caso do Ensino/Aprendizagem do Português Europeu L2, entre os 40 alunos aceites (de 130 candidaturas) em 2007/08 figuram, segundo Tjerk Hagemeijer, tutor do curso, «leitores de Português, professores do ensino corrente, estudantes ou professores de Português estrangeiros (...), com algum destaque para hispano-falantes que ensinam Português». As motivações são pois profissionais e de enriquecimento curricular.
Já o alvo de um curso «muito específico» como a A Novíssima Poesia Portuguesa e a Experiência Estética Contemporânea apresenta um «cariz sofisticado», refere o seu responsável Luís Carmelo, escritor e professor universitário. O curso «convoca sobretudo leitores, mestrandos ou até doutorandos», diz.
Vantagens/desvantagens
As vantagens do ensino a distância para os alunos são óbvias. De qualquer ponto do globo, de acordo com as suas conveniências, podem aceder ao curso. A possibilidade de descarregarem todos os materiais, criando «o seu próprio ‘espólio\'» para actividades lectivas é outra vantagem, de acordo com Hagemeijer, que destaca ainda o facto de «pessoas com perfis (backgrounds) e experiências muito diversos» se poderem «cruzar e trocar ideias nos fóruns de discussão».
Para Luís Carmelo, a experiência que tem da modalidade presencial diz-lhe que «os níveis de concentração, as regras do jogo e a determinação gerada pela disciplina do cronograma de curso fazem toda a diferença» no contexto virtual, de tal forma que «se tivesse de escolher», a parte presencial não passaria naqueles de um complemento. Admite embora que possa ser para si «mais difícil e cansativo do que o regime presencial. Mas vale muito mais a pena. É bem mais reconfortante. E até compensador».
No prato das desvantagens coloca apenas o desconhecimento físico inicial entre os membros da comunidade. Um senão ultrapassado pela «verdadeira festa» quando se encontram no final e pelas «histórias fabulosas e motivadoras neste campo».
Entre as desvantagens, Tjerk Hagemeijer, que é também investigador do Centro de Linguística da Universidade Lisboa, enfatiza o «absentismo». «Há sempre uma percentagem de inscritos que não começa o curso ou não o acompanha até ao fim. É notoriamente mais fácil desistir de um curso virtual do que de um curso presencial», regista.
Este professor de origem holandesa reconhece dificuldades específicas dos cursos a distância. «Nada substitui uma conversa presencial», sustenta. Por correio electrónico e mensagens, «por vezes, demora bastante para pôr um trabalho final nos eixos».
Tjerk Hagemeijer leva também bastante a sério eventuais tentativas de fraude. Deparou-se já mesmo com um caso de uma resposta de um formando copiada da Wikipedia. Mas considera que «a tendência para fraude não será muito grande»: as pessoas inscrevem-se «de livre e espontânea vontade para ampliar os seus conhecimentos e a sua carreira não dependerá desta formação». Acredita, contudo, que «o aumento da oferta de cursos e de certificação ‘virtual\' poderá ser proporcional ao aumento da fraude». Por isso, diz, «é fundamental que o ensino a distância tenha regras muito estritas em termos de acreditação das instituições que o oferecem».