Companhia de Almada leva jovens coreógrafos à Polónia

Número 141 · 29 de Julho de 2009 · Suplemento do JL n.º 1013, ano XXIX


Dança

A Companhia de Dança de Almada (CDA) vai levar numa pequena digressão ao norte da Polónia em Agosto, com o apoio do Instituto Camões, o espectáculo Entre a necessidade e o medo, com coreografia de Nuno Gomes, um bailarino que desenvolveu este trabalho no âmbito do projecto ‘Jovens Coreógrafos’ – uma das linhas principais da orientação imprimida à CDA pela sua directora e fundadora, Maria Franco, destinada «a apoiar jovens talentos».

Número 141 · 29 de Julho de 2009 · Suplemento do JL n.º 1013, ano XXIX


Dança

Foto de José Figueira  
   
Foto de José Figueira  
FOTOS DE JOSÉ FIGUEIRA  

A Companhia de Dança de Almada (CDA) vai levar numa pequena digressão ao norte da Polónia em Agosto, com o apoio do Instituto Camões, o espectáculo Entre a necessidade e o medo, com coreografia de Nuno Gomes, um bailarino que desenvolveu este trabalho no âmbito do projecto ‘Jovens Coreógrafos’ – uma das linhas principais da orientação imprimida à CDA pela sua directora e fundadora, Maria Franco, destinada «a apoiar jovens talentos».

O espectáculo, que nasceu em 2008 de um convite do Alto Comissariado para a Imigração para assinalar o Ano Europeu do Diálogo Intercultural, foca um tema que se poderia classificar como ‘sociológico’: o da migração «do campo rural para as grandes urbanizações» nas décadas de 70-80 do século passado, segundo o jovem coreógrafo, que iniciou os seus estudos de dança em 1998. Uma realidade com reflexos em toda a Margem Sul, onde tem a sua sede a CDA e para onde imigraram centenas de milhares de alentejanos na segunda metade do século XX, tal como também partiram para França, Suíça e Estados Unidos.

 

Apesar de não ser fácil mostrar as dificuldades de adaptação às grandes cidades, resultantes sobretudo das diferenças culturais, Nuno Gomes, que começou os seus estudos de dança em 1998, considera que «qualquer tema é adaptável à dança», havendo «peças mais descritivas do que outras». Para este espectáculo, que fará a 18 e 19 de Agosto duas apresentações no International Dance Theatre Festival, em Poznan, antes de seguir para Pila (22), Grudziadz (23) e finalmente Gdansk (25 e 26), o jovem coreógrafo desenvolveu um trabalho de pesquisa, por forma a que, «pela expressão corporal, pelo tema musical» e pelos adereços «identificáveis», como por exemplo a famosa ‘mala de cartão’, «o público em geral conseguisse ler aquilo que quis transmitir». A sua coreografia, que «tem um lado sentimental muito forte», sublinha, utilizou «muito o trabalho de campo, o cortar, o semear – coisas que o público conseguisse identificar».

 

Agora, antes de seguir para a Polónia, onde a CDA se apresenta pela quarta vez desde que foi criada em 1990, Nuno Gomes está «a modificar algumas coisas» no espectáculo, «tanto a nível de movimento como a nível de acessórios», pois, refere, «falta ali sempre qualquer coisa, que se pode colocar para melhorar a peça».

 
  FOTO DE JOSÉ FIGUEIRA
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A primeira experiência coreográfica plena de Nuno Gomes – que começou a sua carreira como bailarino profissional na Companhia de Dança do Tejo, passou pelo Centro Coreográfico de Valência, em Espanha, e pelo Lisboa Ballet Contemporâneo, e que colaborou na coreografia de outros projectos, nomeadamente em escolas de dança – foi na Companhia de Bailado da Madeira, no início da década. Entre a necessidade e o medo é a sua segunda coreografia para companhias de dança. Embora ainda se sinta «mais bailarino» e ainda esteja a aprender a ser coreógrafo, o jovem está convicto de que «quando deixar de dançar aquilo que vai querer seguir é coreografar». «Gosto de lidar e ensinar pessoas e adoro passar o meu movimento para outras pessoas», explica. Admite contudo que não é fácil ser coreógrafo. «Há tanta gente a querer fazer o mesmo». E depois não há assim tantos grupos disponíveis e faltam apoios. «Mas será um grande sonho que eu vou tentar realizar», diz.

 

Sobre a digressão à Polónia, Nuno Gomes, que fala agora «como bailarino», diz: «sempre que temos uma viagem, para nós, é sempre muito gratificante, seja dentro, seja fora de Portugal. [É gratificante] mostrar o nosso trabalho e o trabalho que se faz em Portugal e mostrar também a Companhia de Dança de Almada». «Como coreógrafo, é a minha primeira vez que vou para fora de Portugal levar um trabalho meu, portanto sinto-me lisonjeado», declara Nuno Gomes, que agradece a Maria Franco lhe «ter dado a possibilidade de coreografar para a companhia». «Espero vir a coreografar mais vezes», remata.

Uma «companhia de reportório»

 

A Companhia de Dança de Almada (CDA), nascida em 1990 como Grupo de Dança de Almada, foi a consequência lógica do trabalho desenvolvido por Maria Franco quando foi leccionar para a Academia Almadense, em Almada. À sua volta, conta, formou-se um «núcleo de jovens que tinham um grande amor à dança» e que pretendiam seguir uma carreira na dança. Os espectáculos de encerramento de ano lectivo possibilitaram o contacto com o público e a estrutura que se foi criando – hoje em dia com sete bailarinos e mais quatro elementos na produção –, com o suporte da própria Academia Almadense e da Câmara Municipal de Almada acabou por concorrer aos apoios da então secretaria de Estado da Cultura para a dança.

 

Desde o início que a CDA se assume como uma «companhia de reportório», isto é, como uma estrutura profissional que convida coreógrafos para montarem espectáculos com o seu elenco. Nomes como Clara Andermatt, Ana Macara, Amélia Bentes, Benvindo Fonseca, Peter Michael Dietz, Jean Paul Bucchieri, Paulo Ribeiro, Ana Rita Palmeirim e, mais recentemente, Cláudia Dias e Rita Galo coreografaram para a CDA. E pelo próprio elenco da CDA passaram também bailarinos e coreógrafos, como Cláudia Dias, Maria João Garcia e Lina Santos, que depois prosseguiram as suas carreiras noutros lados. «É importante que as pessoas sigam os seus próprios caminhos», diz.

 

Fiel à sua vocação formadora, além do seu programa anual de «estreias absolutas», resultantes dos convites a coreógrafos já consagrados, a CDA tem um programa dirigido a jovens coreógrafos, que lhe surgem propondo trabalhos ou que são convidados pela própria Maria Franco. Outros jovens coreógrafos têm a sua oportunidade apresentando trabalhos na Quinzena da Dança que anualmente a CDA organiza em Setembro com a participação de grupos estrangeiras. Apesar das dificuldades de financiamento deste festival, Maria Franco argumenta que «a partilha desta plataforma internacional com vários países é muito importante».

 

A vertente de formação estende-se à produção de uma linha de espectáculos para o público infantil e juvenil e ao ensino da dança a crianças e jovens, com aulas 2, 3 e 4 por vezes por semana, um programa que poderá vir a fazer parte do ensino integrado quando a CDA tiver novas instalações. Isso poderá ser uma realidade dentro de ano e meio, quando estiver construído o novo Centro de Dança de Almada, que a Câmara Municipal de Almada candidatou ao QREN e cujo projecto já foi aprovado, segundo revela Maria Franco.

 

A CDA situa-se «dentro da dança contemporânea, mas com vários estilos e formas conceptuais», sublinha Maria Franco, que começou pela dança espanhola, mas que uma «formação diversificada», com passagens pela Gulbenkian e Nova Iorque, «fez com que evoluísse como bailarina». Esta opção mais ecléctica penalizou a companhia, no dizer da directora da CDA, «porque não éramos especialistas» numa época em que era esse o entendimento dominante.

 

Maria Franco entende que «há formas muito conceptuais de fazer dança e há formas que são mais técnicas» e nessa dualidade a CDA tenta «manter o equilíbrio». Tal como nas outras artes, «há muitas formas de fazer dança», diz, considerando assim que a dança contemporânea «é muito vasta e muito aberta», tendo de se ter em conta para o público a que se dirige, se este é mais ou menos especializado.