A cinematografia de Rui Goulart está desde hoje em destaque em Cabo Verde, com a apresentação de uma retrospetiva da sua obra no Centro Cultural Português da Praia, na ilha de Santiago, que será depois reeditada, a partir de dia 19 de novembro, no seu polo do Mindelo, na ilha de São Vicente.
O ciclo dedicado a este cineasta nascido em Angola, que cursou teatro no Conservatório Nacional em Lisboa e estudou depois cinema em França, é composto por todas as suas oito películas, cinco das quais longas-metragens.
«Rui Goulart é um verdadeiro fenómeno de culto do cinema europeu independente», dizem os promotores da retrospetiva, cuja realização teve o apoio do próprio cineasta e da Chiado Terrasse, produtora dos seus filmes.
O ciclo é aberto com a mais recente longa-metragem 1ª vez 16mm (2009), que já recebeu vários prémios internacionais e que,«de certa forma, sintetiza as características mais marcantes do seu trabalho: obsessão, independência, originalidade, persistência, improviso, mistura de ficção e realidade, que resultam num lúcido e desapiedado olhar sobre si próprio, o cinema e a sociedade portuguesa.»
1º vez 16mm relata as atribulações de um realizador independente que quer produzir a sua primeira longa-metragem e que tem de optar pelo formato de 16mm, por ser o mais barato. Segundo Rui Goulart, este filme é «um manual de instruções para fazer um filme com pouco dinheiro».
Apesar destas restrições, foi o primeiro filme português a ser exibido comercialmente nos Estados Unidos, Dinamarca e Japão e tem sido apresentado, um pouco por todo o mundo, em festivais e cinematecas. Obteve menção honrosa do Los Angeles Movie Awards e do Golden Palm Award em S. Diego.
Obsessão (1988), a primeira longa-metragem de Rui Goulart e segundo filme da retrospetiva, «nasceu de um sonho, aliado a um enorme espírito de iniciativa e sacrifício de um realizador obstinado (…), a quem se junta um grupo de jovens finalistas da Escola de Cinema».
Essa primeira experiência, com filmagens em Lisboa, Paris e Veneza, marcou profundamente o realizador, pois foi ensombrada por um acidente mortal de um dos participantes (Bruno Lavos), um jovem de 14 anos e ator principal do filme.
prosseguiu, resultando em cinco longas-metragens e três curtas-metragens.
O percurso de Rui Goulart é marcado, segundo o texto que acompanha a apresentação da retrospetiva, por «uma feroz independência em relação ao establishment político, estético e económico, que acrescenta serem os seus filmes regularmente selecionados para festivais em todo o mundo - Veneza, Berlim, Alemanha, Estados Unidos, Argélia, França, etc., - «fascinando plateias em todo o mundo com sua abordagem original e surpreendente do cinema enquanto construção poética baseada no real».
«A sua maneira de filmar e construir as histórias, misturando atores amadores, atores profissionais e personagens reais com atores internacionais (Luz Casal e Marisa Paredes), resulta numa estética de um falso burlesco e improviso persistente, com a intenção de expor ao ridículo as feridas da muito conservadora sociedade portuguesa».