Dele dizem que foi o pintor português que mais tempo viveu em Paris. Para aí foi em 1950, em busca, como outro na época, de «novos conceitos e formas de fazer arte», e aí morreu aos 84 anos em 2008. Primeiro viveu no icónico 6e arrondissement, depois na rue Ernestine, nº 11, no 18e, não longe de Montmartre.
Uma retrospetiva da obra de Raúl da Costa Camelo vai agora estar em exposição a partir de 18 de maio na Residência André Gouveia, na cidade internacional universitária de Paris, uma oportunidade para «redescobrir a profundidade e o rigor do seu trabalho».
Os críticos de arte descrevem a sua obra abstrata como de uma «modernidade intemporal», mas o próprio, numa entrevista ao Jornal de Letras, em 1987, afirmou que o seu objetivo, enquanto artista plástico, foi «encontrar uma ‘caligrafia’ pessoal» que lhe «permitisse não necessariamente ‘imitar’ a natureza mas ‘ser’ a Natureza.»
A escrita, aliás, ocupou um lugar importante na sua vida. Se é certo que foi em Paris que Raúl da Costa Camelo «desenvolveu a sua linguagem estética ao lado de autores como Júlio Pomar, Manuel Cargaleiro ou Vieira da Silva», diferentemente destes foi também «jornalista, politólogo e escritor». Com efeito, a partir de 1956 integrou o ORTF (Office de Radiodiffusion Télévision Française) como jornalista especializado em crónicas culturais e a partir de 1975 encontra-se RFI (Radio France Internacional), como jornalista e chefe de redação. Uma faceta deste «homem curioso por todos e por tudo» que a exposição permite descobrir através de fotografias, pinturas e textos.
A sua vocação como «homem da palavra», cuja pintura «tenta quase atingir uma poética», foi sublinhada pelo jornalista Ricardo Paulouro Neves, quando de uma mostra da obra de Costa Camelo em Castelo Branco, numa exposição organizada por Paula Lisboa.
Nascido na Covilhã em 1924, o pintor frequentou o Liceu de Castelo Branco, a Faculdade de Letras da Universidade de Lisboa, cidade onde frequentou os círculos surrealistas e neorrealistas, por quem «manifestaria admiração pela ‘firmeza dos seus compromissos políticos’, mas a quem apontaria uma falta de sentido de humor», e a Academia Real de Belas Artes de Antuérpia, onde tomou contacto com os expressionistas flamengos e com o movimento contemporâneo CoBrA. «As múltiplas influências da sua obra vão do abstracionismo ao expressionismo abstrato de Kandinsky», diz na apresentação da exposição.
Expôs com frequência em França, Espanha e Portugal, estando representado em várias coleções particulares. Foi uma figura destacada da comunidade portuguesa em França, onde apresentou em 1953 a sua primeira exposição individual.
A retrospetiva, que estará patente até 8 de junho, tem o apoio do Centro Cultural Português/Camões, IP em Paris e insere-se na ‘Noite Europeia dos Museus’ e decorre em associação com a 4ª edição das Chantiers d’Europe Lisbonne-Paris, um festival promovido pelo Théâtre de la Ville de Paris, dirigido pelo luso-francês Emmanuel Demarcy-Mota e que este ano, em junho próximo, é dedicado aos novos criadores portugueses, e com o ‘Parfums de Lisbonne’, um «festival de urbanidades cruzadas entre Lisboa e Paris», promovido a partir de 25 de maio na capital francesa pela companhia de teatro ‘Cá e Lá’.