O “Camões dá que falar” recebeu, no dia 21 de novembro de 2019, José Manuel Mendes, presidente da Associação Portuguesa de Escritores (APE). A sessão decorreu em torno de Fernando Namora (1919-1989), por ocasião do centenário do escritor.
Apresentado pelo Presidente do Camões, I.P., Luís Faro Ramos, José Manuel Mendes, escritor, professor universitário, jurista e antigo deputado, começou por falar de Fernando Namora como “o [escritor português] mais divulgado no mundo, antes de José Saramago”.
“A sua obra encontrou espaços linguísticos tão diferenciados como Europa, América ou Oriente”, notou o presidente da APE, destacando a tradução chinesa de Retalhos da vida de um médico, uma das obras maiores do escritor que também foi médico, até ter de optar entre a escrita e a medicina, e eleger a escrita.
José Manuel Mendes, que além de conhecer profundamente a obra de Fernando Namora privou com ele, percorreu no “Camões dá que falar” marcos da obra do escritor como Domingo à tarde, O Rio Triste, que descreveu como um “projeto central de toda a sua obra ficcionista” onde a “maturidade técnica e o desassossego criativo” levaram a um “romance total”, Diálogo em Setembro, onde se percebe “um talento verdadeiramente invulgar”, ou Deuses e Demónios da Medicina, “espécie de testemunho da grande aventura humana”.
Fernando Namora quis estudar arquitetura e não medicina, contou José Manuel Mendes. “Queria ser arquiteto, mas a família não aceitava isso, sobretudo a mãe. Uma pobre família de Condeixa, com uma pequena loja, queria que Fernando Namora fosse a sua reabilitação social”, explicou.
Questionado pelo Presidente do Camões, I.P. sobre um possível paradoxo em Fernando Namora entre a frieza exigida a um médico e a sensibilidade habitual a um escritor, José Manuel Mendes afirmou que a sua “afetividade intensa fez com que em si permanecesse a genuinidade do homem” e que foi “um humanista irredutível e radical”.
Nesta sessão do “Camões dá que falar”, o presidente da APE evocou ainda o também escritor David Mourão-Ferreira a propósito do papel atual das universidades na literatura. “Não me apraz a aplicação de uma grelha tecnocrática à leitura das obras, sem a compreensão profunda dos seus caudais narrativos, da sua força poética. Ouvi isto pela primeira vez a um homem chamado David Mourão-Ferreira”, afirmou.
A propósito do mundo editorial, José Manuel Mendes considerou que o papel das universidades é hoje “diminuto” e que nele “prevalecem hoje critérios de mercado, o que pode fazer com que hoje autores de grande mérito estejam a ser secundarizados”.