Mísia, David Fonseca, Júlio Pereira, Maria João e Mário Laginha, António Rosado (v. texto abaixo). Estes nomes vão declinar em várias modalidades a música portuguesa na VI Mostra Portuguesa em Espanha, que também terá uma componente de reflexão, quando cantores, autores e musicólogos debaterem o papel da música de intervenção nos processos de transição democrática nos dois países.
Número 131 · 22 de Outubro de 2008 · Suplemento do JL n.º 993, ano XXVIII
A fadista portuguesa, actualmente residente em França, abre o conjunto de espectáculos previstos com um concerto a 1 de Novembro no Teatro Albéniz, em Madrid, onde se propõe apresentar Mísia e os seus Poetas, durante o qual vai cantar poemas de alguns dos maiores nomes da Literatura Portuguesa moderna e contemporânea.
A António Botto, Mário de Sá-Carneiro e Fernando Pessoa, Mísia juntou José Saramago, António Lobo Antunes, Agustina Bessa-Luís, Mário Cláudio e José Luís Peixoto, romancistas não propriamente conhecidos pelos seus poemas. Num outro registo, encontramos José Carlos Ary dos Santos, Vasco Graça Moura, Rosa Lobato Faria e Paulo José Miranda, um dramaturgo e poeta de uma geração bem mais nova que a fadista portuguesa aprecia muito.
Embora já Amália tenha cantado os poetas, Mísia, que dá continuidade ao seu disco Garras dos Sentidos (1998), sublinha que o faz «à sua maneira». No que toca aos autores vivos, trata-se de poemas escritos para si, alguns já editados, outros novos, que irão ser incluídos no seu próximo registo (um duplo álbum, que sairá em Fevereiro de 2009, com o nome Ruas). «Foi sempre um ponto de honra e de um certo orgulho» ter autores a escreverem para si, afirma Mísia, acrescentando que lhe «deu muito trabalho» consegui-lo - «nem sempre [os autores] estavam disponíveis». Já nos livros, «procura as palavras dos que já não estão aqui».
Parafraseando Vergílio Ferreira, a fadista portuguesa escreve que «uma língua é o lugar donde se vê o mundo e em que se traçam os limites do nosso pensar e sentir». «Canto pela palavra, depois vem a música...», afirma, acrescentando que «a palavra é o mundo que somos, é uma das minhas pátrias, uma pátria sem fronteiras».
A fadista portuguesa já deu mostras no seu último registo, Drama Box (2005), de estar atenta a outros mercados, nomeadamente de Língua Espanhola, entrelinhando os fados com alguns tangos e baladas românticas em castelhano. Em Espanha é presença assídua. Este ano, em Maio, cantou em Madrid na entrega dos «Prémios de Jornalismo Rei de Espanha». Em Julho, interpretou o papel de narradora na História do Soldado, de Igor Stravinsky, que inaugurou o Festival El Grec\'08, em Barcelona. Espanha é um país onde a fadista portuguesa se sente manifestamente à vontade. Não só a sua mãe era espanhola, como antes de se tornar conhecida Mísia trabalhou em Espanha, na Catalunha.
Mas como Portugal não será só (nem sobretudo fado), o concerto de David Fonseca a 7 de Novembro, na sala Galileu Galilei de Madrid, vem mostrar ao público espanhol, «um imaginativo criador de canções Pop». «Cada vez mais próximo do mainstream anglo-americano, este cantor inclui no seu último álbum [Dreams in Colour] um rosário de canções interpretadas num perfeito inglês, sinal inequívoco das suas ambições cosmopolitas», escreve o programa da VI Mostra Portuguesa a propósito do cantor português, cuja banda integra ao piano e voz a cantora Rita Redshoes.
O concerto de Maria João e Mário Laginha, a 17 e Novembro na Sala das Colunas do Círculo de Belas Artes em Madrid, restabelece um contacto da dupla portuguesa com o público espanhol, ao fim de um interregno de cerca de dois anos, após 28 espectáculos realizados no país vizinho entre 2001 e 2006. A relação é, no entanto, mais antiga, pois em 1985 Maria João recebeu o prémio de melhor intérprete feminina do ano do Festival de Jazz de San Sebastían. Segundo a ONC, produtora da cantora e do pianista português, o espectáculo em Madrid contará já com o repertório do seu novo trabalho Chocolate, editado este mês em Portugal e em Espanha por altura do concerto.
Júlio Pereira, que apresenta em Madrid, a 11 de Novembro, na sala Galileo Galilei, o seu último trabalho, intitulado Geografias, será um dos intervenientes no debate sobre O papel da música de autor nos processos de transição em Portugal e Espanha, que recorda os 20 anos do desaparecimento do cantor Zeca Afonso.
Com Júlio Pereira, que na década de 70 esteve ao lado de nomes como Zeca Afonso, Fausto, José Mário Branco e Carlos do Carmo «como arquitecto do som, como secretário quase-para-tudo», estarão o espanhol Luís Pastor, «talvez o melhor cantautor da sua geração», o musicólogo português Rui Vieira Nery, o crítico musical espanhol Pedro Calvo Guerrero e o jornalista e radialista e director artístico da Mostra, Luís Martín, que será o moderador.