Mais do que o funcionamento das instituições, a economia ou os media, «a escolarização em Português é o motor principal» que "obriga" os moçambicanos a lidarem com a Língua Portuguesa, sustenta a professora da Universidade Eduardo Mondlane, Perpétua Gonçalves.
Número 123 · 12 de Março de 2008 · Suplemento do JL n.º 977, ano XXVIII
No entanto, a escolarização em Língua Portuguesa é por alguns associada a elevados níveis de insucesso escolar, que rondavam até 2004 os 20% nos 1º e 2º ciclos do ensino primário, - em que estudavam em 2005 mais de 3,9 milhões de crianças -, mas que de acordo com os dados públicos mais recentes do Ministério da Educação se reduziram entretanto drasticamente.O insucesso dever-se-ia ao facto de os conteúdos serem em Português, transmitidos por professores que não dominariam o idioma a alunos que não o têm como língua materna. As necessidades de formação de professores são pois ciclópicas e não se esgotam no ensino primário. Nos dois ciclos do ensino secundário, o número de alunos passou de cerca de 121 mil em 2001 para 280 mil em 2005 e o número de professores quase duplicou atingindo os 5 mil em 2005.
É neste campo que o Instituto Camões (IC) tem actuado, através de um protocolo de cooperação com a Universidade Pedagógica (UP) de Moçambique, entidade responsável pela formação de professores no país.
A cooperação data já de 1988/89, mas foi em 2006 que um acordo, mais tarde protocolizado, entre as duas instituições, relativo ao Programa de Formação Contínua de Professores de Português para o Ensino Secundário, lhe deu uma nova dimensão.
O objectivo do programa, que é a mais importante acção de cooperação do Instituto Camões para a difusão da Língua Portuguesa, com um custo global estimado em cinco anos de cerca de 1,5 milhões de euros, é dispensar formação aos professores do ensino secundário moçambicano sem habilitação própria e que já se encontram e permanecem em exercício. Razão pela qual a modalidade escolhida para o curso, que confere o grau de bacharel, é «semi-presencial», o que obrigou a alteração dos currículos de formação.
Segundo a professora Marisa Mendonça, directora da Faculdade de Línguas da UP e coordenadora-geral do programa, cerca de 600 professores estão já em formação nos três primeiros anos do curso de quatro anos. Quando em 2010 terminar a vigência do actual protocolo, os números do projecto prevêem 380 bacharéis e 750 professores em formação. Do lado dos formadores estão envolvidos mais 80 docentes universitários moçambicanos.
Além do financiamento do programa, o IC participa através dos seus leitores na gestão do programa em duplas formadas com os seus pares da UP nos seis centros de Língua Portuguesa espalhados de sul a norte de Moçambique (Maputo, Gaza, Beira, Quelimane, Nampula e Niassa), que centralizam nas províncias as acções de formação.
No entender de Marisa Mendonça, «os grandes objectivos estão cumpridos» e o programa está mesmo nalguns aspectos «muito para além» dos seus propósitos iniciais.
Os formadores do programa têm também realizado «acções directas junto do corpo docente nas escolas secundárias ao nível dos distritos [inferior ao provincial]» e envolvido professores de outras disciplinas, o que não estava previsto inicialmente. O próprio corpo docente universitário tem sido objecto de acções de «capacitação», aprendendo a trabalhar num programa de formação semi-presencial. «O programa é muito mais do que foi pensado», considera Marisa Mendonça, que também destaca o crescimento da capacidade dos gestores do programa.
O aproveitamento escolar dos formandos em 2006, último ano de que está feito o balanço, oscila entre os 70 e 100%, conforme as disciplinas.
Marisa Mendonça sublinha o «espírito de autonomia muito marcado» que os professores em formação têm ganho no regime semi-presencial, que alterna semanas presenciais com semanas de trabalho autónomo.