A primeira e a última longa-metragem de Manoel de Oliveira abrem a retrospectiva do realizador que vai passar entre 7 e 29 de Março no Rose Cinema da BAM Cinematek de Nova Iorque, uma das mais importantes dedicadas até agora nos Estados Unidos ao cineasta português.
Número 122 · 13 de Fevereiro de 2008 · Suplemento do JL n.º 975, ano XXVII
"Aniki Bobó" (1942) e "Cristóvão Colombo, O Enigma" (2007), este último estreado nos cinemas a 10 de Janeiro último, são exibidos logo no primeiro dia da mostra, organizada pelo "braço" cinéfilo da Brooklyn Academy of Music, que apresentará 19 longas-metragens e quatro curtas-metragens do realizador português.
Será a primeira vez que a mais recente película de Manoel de Oliveira, parcialmente rodada nos Estados Unidos e já aí exibida, no Festival do Cinema Europeu de Washington, é apresentada em Nova Iorque, onde a filmografia do realizador é uma presença relativamente constante nos circuitos cinéfilos, como aconteceu em Junho passado com o "Espelho Mágico" (2005) e "O Quinto Império" (2004), que integraram a programação do Anthology Film Archives.
Na apresentação deste tributo, que conta com o apoio do Instituto Camões e da Embaixada de Portugal, a BAM Cinematek sublinha que, sendo inevitável falar da idade do realizador português, que fará 100 anos no final de 2008, desde 1990 Oliveira realiza um filme por ano, "aumentando a sua produtividade e a sua criatividade à medida que envelhece". Ao todo, desde 1990, Manoel de Oliveira realizou 18 das suas 32 longas-metragens.
A mostra decorre sob o tema de "Os Filmes Falados de Manoel de Oliveira" [The Talking Pictures of Manoel de Oliveira], numa alusão ao trabalho do realizador "enraizado na tradição literária europeia de Johann Wolfgang von Goethe, Gustave Flaubert e Eugène Ionesco, a par da dos escritores portugueses, enquanto usa o seu estilo reflexivo para desafiar a natureza do próprio cinema", justifica a BAM Cinematék na apresentação do evento.
"Desafiando de modo impressionante a ideia de que os filmes devem ser menos palavrosos e mais visuais, Oliveira retira o flash e o melodrama do seu trabalho para se focar nas palavras e ideias que transporta", considera a BAM Cinematek sobre a cinematografia do único grande realizador em actividade que ainda trabalhou no cinema mudo.
Pela sua importância e pela invulgaridade da sua obra, Manoel de Oliveira é já tema de estudo de seminários nas universidades norte-americanas, como já aconteceu em Harvard.
A mostra, que inclui nomeadamente a "tretalogia dos amores frustrados" - "O Passado e o Presente (1971), "Benilde ou a Virgem Mãe" (1975), "Amor de Perdição" (1978) e "Francisca" (1981), compreende também quatro curtas-metragens: "O Pintor e a Cidade" (1956), "O Pão" (1964), "A Caça" (1964) e o primeiro filme de Oliveira "Douro, Faina Fluvial" (1931).
A retrospectiva de Oliveira, organizada pelo BAM com a colaboração do cinéfilo português António Pedroso, radicado na "Big Apple", deverá depois percorrer os Estados Unidos durante este ano.
Selecções dos filmes que integram a retrospectiva estão previstas para Boston (Harvard Films Archive), de 15 a 29 de Março, em Los Angeles (UCLA), ao longo do mês de Abril, Cleveland (Cleveland Institute of Art), entre Maio e Junho, e Berkeley/San Francisco (Berkeley Art Museum/Pacific Film Archive), entre Julho e Agosto
A organização de uma retrospectiva com esta dimensão da obra de Oliveira nunca é fácil, porque os direitos relativos à exibição dos filmes estão espalhados por várias entidades.
Não é a primeira vez que a BAM dá atenção ao cinema português. Em 2001, a Associação para a Promoção do Cinema Português levou a Nova Iorque 34 filmes portugueses, desde Leitão de Barros a Manoel de Oliveira, com sete filmes e já então o grande homenageado, passando César Monteiro, Paulo Rocha, Pedro Costa, João Botelho, Teresa Villaverde, António Reis, Manuela Viegas, João Pedro Rodrigues e Edgar Pêra.
A BAM Cinematek apresenta-se publicamente como sendo, entre as instituições culturais norte-americanas, a única no país que tem um centro de artes performativas, com dois teatros de raiz e quatro salas de cinema multiplex, nas suas instalações. Cerca de 48 mil espectadores assistem anualmente a retrospectivas de grandes realizadores e de géneros, filmes mudos, filmes não distribuídos e outros espectáculos.